sábado, março 24, 2007

Resultados (3)

Doença Grave vivida como uma Jornada Espiritual : Reflexões de Doentes Hematológicos

É hoje consensual que a Espiritualidade afecta as respostas humanas em relação à doença, sendo um factor importante a ter em conta no acompanhamento e tratamento dos clientes e seus familiares ou pessoas significativas.
No entanto, esta abordagem tende ainda a ser vista com alguma incredulidade por alguns profissionais de saúde, o que restringe o potencial da intervenção passível de ser alcançado. Os Enfermeiros, na minha opinião, continuam a ser os profissionais de Saúde melhores habilitados a realizarem este acompanhamento, quer no seu diagnóstico, quer no seu respectivo tratamento.
Não há actualmente falta de literatura sobre esta temática, mas antes uma ausência de divulgação dos artigos científicos já publicados, estando o seu acesso limitado aos que dispõem de assinaturas ou aos que têm facultado a acesso às bases de dados.
É por isso que considero importante relatar essas experiências, de forma a que a abordagem da Espiritualidade pelos Enfermeiros seja cada vez mais profissionalizante...

Em anterior artigo neste blog, tive o grato prazer de ver publicado um comentário sobre um artigo que relatava o desenvolvimento de um Modelo de Apoio Espiritual a clientes e seus significativos em situação de Doença Crítica. Considero a criação destes modelos de grande importância, pois esta abordagem necessita de ser científica, e não limitada à subjectividade de cada um.
No entanto, é igualmente imprescindível perceber as necessidades e os percursos dos clientes que necessitam de Apoio Espiritual, de forma a que a nossa intervenção atinja os resultados desejados.
Desta forma, apresento aqui o meu comentário a um artigo de P. Mcgrath (*), publicado no European Journal of Cancer Care (2004). O autor colaborou num estudo patrocinado pelo "Queensland Cancer Fund" (na Austrália) que, durante dois anos, pretendeu perceber a relevância da Espiritualidade e da Dor Espiritual nos doentes hospitalizados, nos seus cuidadores, nos profissionais de saúde, nos sobreviventes e nos doentes sob tratamento. O estudo realizado pelo autor abordou só os clientes sobreviventes com diagnósticos hematológicos (Leucemia, Linfomas, Mielomas). Segundo o autor "os pacientes com estes diagnósticos clínicos enfrentam um potencial risco de vida associado a tratamentos invasivos, agressivos, que se extendem por longos períodos de tempo" (tradução livre). Estes clientes aceitaram colaborar no estudo e serem submetidos a entrevistas.
Os resultados apresentados pelo autor referem que todos os participantes no estudo descreveram a sua experiência como doentes como uma Jornada Espiritual que teve consequências directas no seu crescimento pessoal e no seu "sentido de vida". Esta descrição surgiu num contexto em que a maioria dos participantes não tinham actividade religiosa nem necessariamente uma crença em Deus ou na Vida após a Morte. É referido pelo autor que os doentes referiam "sentir-se protegidos, sentirem-se escolhidos para encontrarem um sentido para a sua vida, mas sem referência a crenças ou a vivências religiosas" (tradução livre).
Para mim, estes resultados funcionam como um alerta, pois implica que todos os clientes em situação de doença grave podem necessitar de cuidados espirituais, independentemente da sua opção religiosa ou convicções e crenças.
Outro resultado referido é que os doentes submetidos a tratamentos agressivos com risco de vida, tornam-se mais conscientes da fragilidade da vida humana e da sua própria mortalidade.
É ainda descrito que os clientes sentem ser "salvos" por uma razão, o que os leva a considerar a existência de um "poder". É referido pelo autor que "o sentir-se escolhido é acompanhado pelo sentir-se protegido, pelo que mesmo quando chegar o fim (leia-se morte...) este decorrerá favoravelmente" (tradução livre). Esta conclusão, para mim, implica que os cuidados espirituais não estão condicionados pelos prognósticos clínicos.
É ainda relatado que "os participantes indicaram que uma aproximação espiritual à doença e ao tratamento foi útil e providenciou que esta fosse observada de uma forma positiva" (tradução livre). Esta conclusão reforça o papel importante que os profissionais de saúde podem ter no acompanhamento destes clientes.
Sem retirar importância à restante equipa multidisciplinar, reforço a minha convicção de que os Enfermeiros se encontram em condições para estar na vanguarda no acompanhamento destas necessidades.
Obviamente, este artigo é suficientemente rico em resultados e deve merecer uma leitura mais aprofundada pelos interessados no tema. Por mim, pretendi apenas salientar algumas conclusões, que a serem tidas em conta, podem ajudar a melhorar os resultados dos nossos cuidados.

Carlos Cargaleiro

(*) Mcgrath, P. - Reflections on Serious Illness as Spiritual Journey by Survivors of Haematological Malignancies. European Journal of Cancer Care, nº 13, 2004, pág.227-237.

1 comentário:

Anónimo disse...

olá, meu nome é adriana, muito interessante o texto, sou enfermeira, aliás estou pensando em fazer meu trabalho de conclusão da pós como pesquisa bibliográfica sobre o tema espiritualidade. se souberem de algumas referências na área me escrevam, por favor. obrigada.