sábado, dezembro 30, 2006

Escutar os outros (4)

The most beautiful thing we can experience is the mysterious. It is the source of all true art and all science. He to whom this emotion is a stranger, who can no longer pause to wonder and stand rapt in awe, is as good as dead: his eyes are closed.

Albert Einstein

quarta-feira, dezembro 27, 2006

Narrativas (5)

1. Hoje uma reunião especial de família. Conversámos sobre o amanhã que será novamente duro de aguentar. Lembrámo-nos daquela primeira vez há já um ano e sete meses. Sofremos imenso com a vinda indesejada de um carcinoma que nos mobilizou a todos qual exército em estado de alerta, de prevenção. Permitimos que um maligno nos atormentasse. Mas jamais nos demoveu da confiança em Deus, cujos desígnios são insondáveis. Para quem não crê, nunca entenderá esta nossa serenidade com tumor e temor. Dizemos pois, do tumor à esperança... com fé!

2. Um dia inteiro no Hospital, desde as 09h30. Acompanho-o para mais uma cirurgia depois de ter sido detectado um carcinoma. Inicialmente, mostrava-se calmo. Com o decorrer das horas, vai sendo notória a ansiedade em crescendo. Os receios de ser detectado mais do que já se sabe, manifestam-se sob a forma de perguntas retóricas. A perplexidade sobre o resultado de uma tal intervenção médica vai substituindo o riso por um olhar cada vez mais fixo num horizonte abstracto. Manifesta-se cada vez mais apreensivo e já não suporta tanta espera, pois são já 16h30. De repente, entra no quarto um enfermeiro de serviço ao “talhante”, com uma maca sobre rodas e chama pelo doente. Deitado sob um lençol branco, a caminho do bloco operatório, olha-me e diz - «Agora é que é...!». Coloquei a minha mão direita na sua cabeça e sorri-lhe, acenando a cabeça como quem diz - «Não temas. Espero aqui por ti.» E esperei no quarto, em silêncio, orando por ele, conversando com Deus a propósito de tudo. Eram 19h30 e uma enfermeira veio informar-me de que a operação foi bem sucedida e ele estava agora no recobro. Acrescentou ainda que o médico cirurgião viria para falar comigo. Fiquei aguardando. Agora estava eu ansioso. Desejava saber o que o médico teria visto por dentro dele, martirizado por uma terrível surpresa que atentava contra a sua qualidade de vida. Ele nunca entendeu a perda da vida como uma desgraça, pois a sua fé conduz os seus passos para a eternidade com Deus. Mas enquanto viver neste mundo, do lado de cá da passagem, luta por uma existência qualificada, gostosa e o menos dorida possível. Voltei a casa com ele no pensamento e no coração da amizade.

3. Desde ontem, a noite toda, mais a manhã até às 12h00 no Serviço de Cuidados Intensivos (no Hospital falavam-me em “recobro”), passou sem dores e sem dormir. Faltou-lhe o habitual comprimido que o sossega sonolento. Fui visitá-lo quase de imediato quando soube que já estava no seu quarto. Encontrei-o sorridente, a voz um pouquinho rouca, os olhos vivaces num rosto limpo, deitado, com um lençol apenas a tapar-lhe o corpo, qual corporal estendido sobre o altar para Aquele que se entregou por nós, o Salvador, Jesus Cristo. Vi dois drenos pelos quais escorriam sangue e uma água que parecia leitosa. Um penso enorme cobria grande parte do seu pescoço, o lugar de intervenção do “talhante”. Disse-me de imediato que não tinha dores e estava bem, apesar de tudo. Gostou imenso das flores que lhe ofereci. Entre elas, um girassol, com que se identifica, sempre voltado para Deus. Conversámos sobre as perspectivas de sair dali no dia seguinte e o tratamento a continuar. Chegou o médico, observou-lhe os drenos, viu por detrás do enorme penso, e soltou secamente - «Isto está bom. Coloque gelo sobre o corte, e amanhã já o mando para casa. Esteja sossegado, pois está tudo bem. Quanto ao que lhe retirámos, vai para análise. Numa observação macroscópica, julgo que é apenas aquele gânglio positivo. Mas só depois da análise microscópica é que saberemos com certeza o que encontrámos. Para já, estou confiante que limpámos tudo e que não deixámos lá nada de mal. Mas... depois veremos! Até amanhã.» Olhámo-nos e entendemo-nos sem palavras. Cúmplices no temor por causa do tumor e companheiros de uma mesma esperança por causa da única fé. No dia seguinte veio comigo para casa.

Frei Luís de Oliveira

terça-feira, novembro 28, 2006

Narrativas (4)

Um sorriso espontâneo. A alegria de regressar a casa: são e salvo! Como ele dizia. Para trás, as intempéries de um bloco operatório, onde esteve por duas vezes seguidas pois da primeira intervenção surgiu um hematoma que foi necessário remover com urgência. Olhando ao pescoço é caso para dizer «De papo cheio»! Um corte longo, embora não muito profundo. Conversa descontraído. Come e bebe naturalmente sem esforço. Transmite a imagem de um homem calmo e forte. Mas todos sabemos da sua fragilidade, da sua necessidade mais do que nunca das expressões de afecto, da sua incapacidade de aguentar as dores físicas. Desta vez não se queixa. Confirmamos que nada lhe dói no corpo. Mas dói-lhe que os resultados ainda não tenham vindo do exame feito a toda aquela ramificação linfática que lhe foi extraída e em que um dos nódulos é canceroso. Decide manter-se eremita em sua casa resguardado das perguntas incómodas dos familiares e amigos. Até saber tudo. Está profundamente apreensivo. Percebemo-lo sempre que o seu silêncio é acompanhado por um olhar vago e fixo num ponto sabe-se lá onde! Volta a si quando o interrompemos nessas viagens interiores em que se questiona sobre estas últimas páginas do seu livro que nunca pensou vir a escrever. Escreveu muito aulas, investigações, artigos, livros, conferências, cartas... Agora escreve sem saber como «Do tumor até à esperança... com fé.»

[enviado por Frei Luís de Oliveira, ofm]

sábado, novembro 25, 2006

Teoria (3)

A Saúde como tarefa Espiritual

A saúde espiritual, no processo global do cuidar, foi abordada por Dufner e Grun.
Os autores apontam algumas pistas para caracterizar uma espiritualidade como «saudável». São elas:

Mistagógica e não moralizadora
Mistagógica quando introduz ou inicia o indivíduo no mistério de Deus e no mistério da pessoa.
A moralizante tem como principal objectivo evitar as faltas e os pecados. Parte do ideal de perfeição moral e está em permanente perigo de criar escrúpulos de consciência.

Libertadora e não asfixiante
Uma espiritualidade saudável tende a introduzir o ser humano numa vivência de Liberdade: a liberdade dos filhos de Deus. A liberdade interior, que se consegue por uma ascese espiritual, é o único local onde se consegue a libertação dos factores exteriores condicionantes, nomeadamente as expectativas e exigências que são impostas.

Criadora de unidade e não de divisão
Uma espiritualidade saudável implica na relação com os outros com sentimentos fraternos.
O indivíduo sente-se profundamente solidário com cada ser humano: nas suas limitações e fragilidades, e no desejo de salvação.
Quando uma «espiritualidade» classifica as pessoas em crentes e não crentes, entre ortodoxos e hereges, entre piedosos e depravados, entre bons e maus, está a dar uma mostra clara de que é uma espiritualidade a precisar de cura.
Uma espiritualidade de unidade valoriza o sentido das relações interpessoais
A vida espiritual saudável precisa de boas relações humanas, cordiais, relaxadas, nas quais se possa dedicar aos outros o próprio tempo.
Uma amizade autêntica e profunda fertiliza a vida espiritual.

Encarnada e não separada da realidade
Uma espiritualidade sã capacita a pessoa para, a diário, fazer bem as suas coisas, superando as dificuldades inevitáveis do trabalho e do contexto social.
Se se busca na espiritualidade uma fuga à realidade, está no bom caminho para “adoecer no espírito”.

Que procura Deus e não os seus consolos
O cultivar a vida espiritual tem como objectivo ter experiências espirituais.
Mas há o perigo de se ficar pelas vivências e sentimentos, que acabam por ser o mais importante, relegando a questão do sentido – e Deus – para um segundo lugar.
As experiências isoladas nada dizem da qualidade da vida espiritual. Esta demonstra-se no caminho do amor dado e recebido nas interligações fraternas, e consequente compromisso.

Global e não excluente
Uma espiritualidade saudável contempla a totalidade da pessoa, todas as suas dimensões:
- entendimento e vontade;
- coração e sentimentos;
- espírito e corpo;
- consciente e inconsciente .
Tudo deve ser abrangido pela vida espiritual.

Humilde e não orgulhosa
A humildade é o melhor critério para discernir da saúde de uma vida espiritual.
“A humildade é a base e o fundamento de todas as virtudes e sem ela não há nenhuma que o seja” (Cervantes).


In LA SALUD COMO TAREA ESPIRITUAL
DUFNER, MEINRAD y GRUN, ANSELM
NARCEA, S.A. DE EDICIONES
ISBN: 8427713320


[enviado por L.M. FIGUEIREDO RODRIGUES]

terça-feira, novembro 07, 2006

Resultados (2)

A Espiritualidade é uma dimensão da Pessoa, que como as outras, em situação de doença, deve merecer igual prioridade por parte dos profissionais de saúde. Na actualidade, muitos estudos da Academia provam estas realidades e das consequências benéficas para os pacientes e seus significativos. No entanto, continua a ser necessário a existência de estudos de caso que permitam de uma forma mais concreta, operacionalizar a ajuda que os profissionais de saúde, especialmente os Enfermeiros podem prestar.

No "Critical Care Nurse" de Dezembro de 2005, o artigo "Intensive Spiritual Care"[1] realiza esse objectivo. Descreve uma situação de internamento numa Unidade de Cuidados Intensivos de uma doente de opção religiosa Budista, estando o seu estado crítico e havendo barreiras de comunicação com a família por esta não falar bem Inglês (não posso aqui deixar passar a analogia com a situação portuguesa, com o aumento do número de imigrantes com outras linguas-mãe e confissões religiosas...).

Para a prestação de cuidados de Enfermagem, foi sentido pelos autores do artigo a necessidade da existência de um Modelo de Apoio Espiritual, tenso sido proposto o modelo de Fitchett de 7 Dimensões.

As Dimensões propostas por Fitchett são [tradução livre]:

1 - Crenças e Significados - Missão pessoal ou religiosa, a justificação dos eventos ou circunstâncias, a percepção do significado da vida;

2 - Autoridade e Orientação - Individuo ou grupo em que a pessoa ou a sua família deposita confiança e procura aconselhamento, recursos (textos religiosos) a que os doentes ou as suas famílias possam recorrer;

3 - Experiências e Emoções - Percepções do evento ou da circunstância associada à doença, suas consequências emocionais face à experiência;

4 - Comunidade - Grupo formal ou informal que partilha crenças e rituais comuns;

5 - Rituais e Práticas - Actividades significativas e tradições específicas;

6 - Coragem e Crescimento - dúvidas, as mudanças ocorridas nas suas vidas e os desafios enfrentados;

7 - Vocação e Consequências - decisões morais e éticas que manifestam a m resposta ao chamamento das suas crenças.


A reflectir...

[Enviado por CARLOS CARGALEIRO]

_________________
[1] Johnson, TD - Intensive Spiritual Care. A Case Study. Critical Care Nurse, Vol 25, nº 6, Dez 2005:20-27

terça-feira, outubro 03, 2006

Teoria (2)




“A religiosidade popular aparece-nos como um conjunto de comportamentos, ritos e gestos religiosos de um povo, caracterizados pela simplicidade que, dentro da bipolaridade «religião oficial/religião praticada», manifestam, por um lado, a sua relação com o divino, e por outro, a sua contextura sócio-cultural portadora de elementos étnicos e de «desvios» inconscientes”.


In LIMA, José Da Silva – Deus, Não Tenho Nada contra : Socialidades e Eclesialidade no Destino do Alto – Minho: Faculdade Teologia Porto, (Dezembro) 1994. (Biblioteca Humanística e Teológica) ISBN 972-9290-09-1

[enviado por L. M. FIGUEIREDO RODRIGUES]

sexta-feira, setembro 29, 2006

Escutar os outros (3)


Da mesma forma que não se pode curar os olhos sem a cabeça,
Ou a cabeça sem o corpo
Também não de deve tentar curar o corpo sem a alma.
Pois a parte nunca pode ficar boa,
Se o todo não estiver bem


Platão

[enviado por J.C.Quaresma]

sábado, agosto 19, 2006

Teoria (1)

O Spiritual Work Group do International Work Group on Death, Dying, and Bereavement publicou em 1990 trinta e um pressupostos e princípios sobre cuidados espirituais aos pacientes e suas famílias, profissionais de saúde, comunidades, investigação e educação nesta área[1]. Estes pressupostos reconhecem que todas as pessoas têm uma dimensão espiritual, que expressam de diferentes formas e que influencia como os pacientes e seus cuidadores experienciam a doença, o morrer ou o luto.

Elizabeth Taylor propõe-nos uma selecção de doze daqueles pressupostos e princípios [2]:

  • Pressuposto: Cada pessoa tem uma dimensão espiritual.
  • Princípio: No cuidado total, a natureza espiritual da pessoa deve ser considerada tanto quanto as dimensões física, mental, emocional.
  • Pressuposto: Numa sociedade multicultural a natureza espiritual de cada pessoa é expressa por crenças religiosas e filosóficas e as práticas diferem substancialmente, dependendo da raça, do género, do estatuto social, da religião, da etnia e da experiência de cada um.
  • Princípio: Uma única abordagem de cuidados espirituais não é suficiente em sociedades multiculturais; são necessários muitos tipos de recursos.
  • Pressuposto: A espiritualidade tem muitas facetas. Expressa-se e desenvolve-se por caminhos formais e informais, religiosos e laicos.
  • Princípio: Deve estar disponivel e acessível uma grande variedade de oportunidades para expressar e desenvolver a espiritualidade.
  • Pressuposto: O ambiente molda e pode desenvolver ou prejudicar a espiritualidade.
  • Princípio: Os planos de cuidados devem considerar as preferências individuais e experiências comunitárias.
  • Pressuposto: Os clientes podem ter já um modo de satisfazer as suas necessidades espirituais de forma satisfatória.
  • Princípio: Os enfermeiros deverão respeitar a forma como os clientes satisfazem as suas necessidades espirituais.
  • Pressuposto: As necessidades espirituais dos clientes podem variar no decurso de uma doença.
  • Princípio: Os enfermeiros precisarão estar atentos à variação das preocupações espirituais que podem ser expressas nas diferentes fases da doença.
  • Pressuposto: As necessidades espirituais podem surgir a qualquer hora e em qualquer dia.
  • Princípio: Um ambiente cuidativo deverá estar preparado para promover cuidados espirituais em qualquer momento.
  • Pressuposto: Os seres humanos têm diferentes níveis de desenvolvimento espiritual, crenças e formas de conhecimento.
  • Princípio: Os enfermeiros deverão conhecer vários sistemas de crenças e compreender a interpretação que o cliente faz deles.
  • Pressuposto: Os clientes e as suas famílias podem ter diferentes crenças espirituais e não estar conscientes disso.
  • Princípio: Os enfermeiros deverão conhecer as diferentes crenças dos membros da família e estar atentos às dificuldades que isso pode provocar.
  • Pressuposto: A forma como cada cliente e família deseja analisar e partilhar problemas espirituais é muito individual.
  • Princípio: Os enfermeiros devem ser sensíveis aos desejos individuais e não ser intrusivos.
  • Pressuposto: Os clientes nem sempre estão conscientes ou capazes, ou desejam falar de questões espirituais.
  • Princípio: Os enfermeiros, conscientes que o cliente não quer partilhar com eles questões espirituais, devem providenciar o acesso a outros recursos que o cliente deseje.
  • Pressuposto: O crescimento e cura espiritual podem ocorrer sem ajuda. Muitas pessoas não desejam nem precisam de assistência profissional no seu crescimento espiritual.
  • Princípio: A afirmação da disponibilidade de ajuda espiritual, se desejada, pode ser tudo quanto o paciente precisa.

    [tradução livre]
    _________________________
    [1] International Work Group on Death, Dying, and Bereavement (1990). Assumptions and principles of spiritual care. Death Studies. 14(1):75-81.
    [2] Taylor, Elizabeth J. (2002) - Spiritual Care. Nursing Theory, Research, and Practice. Upper Saddle River, New Jersey: Prentice Hall. p. 25-27

sábado, agosto 12, 2006

Conceitos (5)

Espiritualidade é:
the quality of those forces which activate us, or are the essential principle influencing us. Spiritual, although is might, does not necessarily mean religious; it also includes the psychological. The spiritual is opposed to the biological and mechanical, whose laws it may modify"

(Vaillot, M. C. (1970) "The spiritual factors in nursing". Journal of Practical Nursing, 20, p. 30)

[“a qualidade daquelas forças que nos estimulam, ou são o princípio essencial que nos influencia. Espiritual, embora possa ser, não significa necessariamente religioso; inclui também o psicológico. O espiritual é oposto ao biológico e mecânico, cujas leis pode modificar " (tradução de Ana Caramelo) ]

Conceitos (4)

Espiritualidade é:

"involves a vertical dimension (i.e., a person's relationship with God, the transcendent, supreme values) and a horizontal dimension (i.e., which "reflects and 'fleshes out' the supreme experiences of one's relationship with God through one's belief, values, life-style, quality of life, and interactions with self, others, and nature..."

(Stoll, R.L. (1989), The essence of spirituality. In Carson, V.B. (ed), Spiritual dimensions of nursing practice. Philadelphia: Saunders, p.7)

[“envolve uma dimensão vertical (por exemplo, relacionamento de uma pessoa com Deus, o transcendente, os valores supremos) e uma dimensão horizontal (por exemplo, que “reflecte e encarna as experiências supremas do relacionamento com Deus através das suas crenças, valores, estilos de vida, qualidade de vida, e interações com o eu, os outros e a natureza…” (tradução de Ana Caramelo) ]

domingo, julho 30, 2006

Narrativas... (3)

[...] Gosto do paradigma de um Deus criador, um Deus poético com o prazer de criar seres humanos que sejam a alegria uns dos outros e façam, deste mundo, um jardim para todos (Génesis 1 - 2).
Gosto de um Deus que não se preocupa com Deus - nem com o culto divino -, um Deus que não cuida de Deus, mas das relações entre os seres humanos que são irmãos, embora julguem que são rivais e procurem levar as suas rivalidades até aos céus. Diante da guerra, a Sua preocupação declarada é esta: que fizeste do teu irmão? A voz do seu sangue brada aos céus, mas ai de quem responde à violência com violência (Génesis 4) [...].


Frei Bento Domingues, in Publico, Lisboa, 23.7.2006

[ler aqui texto integral]

Narrativas... (2)


Que venho procurar a Taizé? Eu diria uma espécie de experimentação com aquilo em que acredito muito profundamente, nomeadamente que aquilo a que geralmente se chama religião tem a ver com a bondade. Está um pouco esquecido, em particular em várias tradições do cristianismo. Quero dizer que há uma espécie de restrição, de fechamento na culpabilidade e no mal. Eu não subestimo de forma nenhuma este problema, que muito me ocupou durante várias décadas. Mas, aquilo que de alguma forma tenho necessidade de verificar, é que por muito radical que seja o mal, não é tão profundo como a bondade. E se a religião, as religiões, têm um sentido, é o de libertar o fundo de bondade dos homens, de ir procurá-lo aí onde ele está completamente escondido. Ora, aqui em Taizé, eu vejo irrupções de bondade na fraternidade entre os irmãos, na sua hospitalidade tranquila, discreta, e na oração, onde vejo milhares de jovens que não têm articulação conceptual do bem e do mal, de Deus, da graça, de Jesus Cristo, mas que têm um tropismo fundamental em direcção à bondade."

Paul Ricoeur, durante a sua estada em Taizé na Semana Santa de 2000

[texto e foto encontrados aqui ]

Narrativas... (1)

Ao longo dos anos, o Irmão Roger e a Madre Teresa encontraram-se nas situações mais diversas, não só em Calcutá e em Taizé, como também noutros locais.
O Irmão Roger escreveu: «Perto do corpo de Madre Teresa, recordei-me de tudo o que tínhamos em comum e de um modo especial apercebi-me até que ponto nas nossas vidas a oração nos tinha sempre oferecido a frescura de uma fonte. Vivíamos a mesma certeza, uma comunhão com Deus fazia sair de nós próprios e estimulava a aliviar o sofrimento humano sobre a terra.»

[encontrado aqui]

sexta-feira, julho 28, 2006

Reflexão (1)

[na sequência da minha última conversa com a Florbela…]

O desenvolvimento da consciência espiritual é essencial para a aquisição de competências na área dos cuidados espirituais. Danvers afirma mesmo que “para identificar as necessidades espirituais do paciente, as enfermeiras precisam ter consciência da sua própria espiritualidade, quer seja no âmbito de uma religião oficial, quer numa forma menos convencional”(1).
Vamos percebendo que alguns enfermeiros não pensam muito acerca da sua própria espiritualidade ou ficam desconfortáveis com a exploração dos seus pensamentos, sentimentos e crenças espirituais… No entanto, a consciência que o enfermeiro tem da sua vida espiritual, pode ter uma profunda influência na sua capacidade de oferecer cuidados espirituais efectivos e eficientes.
Por exemplo:
1. se tenho alguém com quem discuto a experiência de “ausência” de Deus na minha vida, posso estar disposta a escutar a dor espiritual do meu paciente quando este me confia: “por vezes interrogo-me se Deus está comigo….”
2. se fui magoada por membros da minha igreja e não acredito mais que as formas institucionalizadas de religião podem ajudar no desenvolvimento espiritual, evitarei chamar o capelão do hospital acreditando estar a agir no melhor interesse do paciente…

Tomar consciência do que se passa comigo pode fazer toda a diferença, não vos parece?

(1) Danvers, M. A. (1998) Keeping in good spirits. Nursing Management, 5(5), 35-37

Margarida Vieira

domingo, julho 23, 2006

Sugestões (5)

Vale a pena ler:

Clarke J. (2006), "A discussion paper about 'meaning' in the nursing literature on spirituality: An interpretation of meaning as "ultimate concern" using the work of Paul Tillich".International journal of nursing studies.Jul 13

Spirituality is often explained in the nursing literature as the patient's quest to find meaning in life and in their experiences. This is most often described in an unlimited and unconditional way defined by whatever interpretations the person places upon it. This opens it to a variety of understandings, some of which may be negative and unhelpful in terms of what we usually consider to be spiritual well being. This discussion paper attempts to look beyond the generality of this idea to examine whether our concept of having meaning, if used in terms of spirituality, should be conditional on meanings which are actually to do with the depth of our being and not meanings which only give pleasure and satisfaction. The paper attempts to do this in two ways. First it explores the beliefs of Victor Frankl to ask the question whether having meaning alone is sufficient to provide spiritual comfort or whether the content of the particular beliefs associated with meaning, may matter. Frankl is often used as a source for the idea of spirituality being to do with meaning and in this paper Frankl's thought is explored in detail to see his own underlying beliefs which helped in his life experiences. Secondly, an understanding of 'meaning' as being conditioned by something "ultimate" described by Paul Tillich is explored. This would give nursing a more structured and purposeful approach to using the term 'meaning' in relation to spiritual care and in addition it would open up a way forward in terms of researching which particular meanings might be most helpful in illness and adversity.

sábado, julho 22, 2006

Resultados (1)

Religiosidade entre adultos americanos

Crenças básicas

83% acreditam na existência de Deus.
80% acreditam ter uma relação pessoal com Deus.
12% acreditam na existência de um espírito ou força da vida.
5% não conhecem ou não acreditam em Deus ou outra transcendência.
65% acreditam no demónio.
90% acreditam no céu.
73% acreditam no inferno.
79% acreditam em milagres.
72% acreditam em anjos.
27% acreditam na reincarnação.
23% acreditam na astrologia.
80% esperam ser chamado diante de Deus no Dia do Juízo.
61% acreditam que o mundo caminhará para um fim ou será destruído.

Religião
69% consideram-se membros de uma igreja, sinagoga, ou outro grupo religioso.
92% afirmam uma preferência religiosa (58% Protestantes, 25% Católicos Romanos, 2% Judeus, e menos de 1% preferem Hinduismo, Budismo ou Islamismo).
58% afirmam que a religião é muito importante na sua vida pessoal (32% afirmam que é moderadamente importante).
61% afirmam que a religião pode responder a todos ou à maior parte dos problemas de hoje.
57% confiam nas organizaçõe sreligiosas.

Práticas
31% vão à igreja regularmente uma vez por semana.
75% oram pelo menos diariamente.
95% afirmam que as suas orações tem sido atendidas.
77% estão satisfeitos com a sua vida de oração.
37% desejam que a sua fé seja reforçada.

Gallup, G.H., Jr (1996)- Religion in American. Princeton, NJ: Princeton Religion Research Center.




Sugestão: aproveite agora e passe pelo CSR (Center for the Study of Religion, Princeton University)

sexta-feira, julho 21, 2006

Conceitos (3)

Espiritualidade é...

"Spirituality refers to the propensity to make meaning through a sense of relatedness to dimensions that transcend the self in such a way that empowers and does not devalue the individual. This relatedness may be experienced intrapersonally (as a connectedness within oneself), interpersonally (in the context of others and the natural environment), and transpersonally (referring to a sense of relatness to the unseen, God, or power greater than the self and ordinary resources)"

P. G. Reed (1992) "An emerging paradigm for the investigation of spirituality in nursing". Research in Nursing and Health, 15, p.350

[“Espiritualidade refere-se à propensão de dar significado através da relação das dimensões que transcendem o ser de tal maneira que dá poder e não desvaloriza o indivíduo. Esta relação pode ser experienciada intrapessoalmente (como uma conexão dentro do próprio “eu”), interpessoalmente (no contexto de outros e do ambiente natural), e transpessoalmente (referindo-se a um sentido de ligação ao oculto, Deus, ou poder superior ao eu e aos recursos ordinários)" (tradução de Ana Caramelo) ]

terça-feira, julho 18, 2006

Conceitos (2)

Espiritualidade é...

"...is rooted in an awareness which is part of the biological make up of the human species.
Spirituality is therefore present in all individuals and it may manifest as inner peace and strength derived from perceived relationship with a Transcendent God/an Ultimate Reality, or whatever an individual values as supreme. The spiritual dimension evokes feelings which
demonstrate the existence of love, faith, hope, trust, awe, and inspirations; therein providing meaning and a reson for existence."
Narayanasamy, A. (1999), "ASSET: A model for actioning spirituality and spiritual care education and training in nursing". Nurse Education Today, 19, p.274-275

[“… está enraizada numa consciência que faz parte do construir biológico da espécie humana.
Consequentemente, a espiritualidade está presente em todos os indivíduos e pode manifestar-se como a paz interior e força, derivadas de relacionamento percebido com um Deus Transcendente/uma realidade Final, ou tudo o que um indivíduo valoriza como supremo. A dimensão espiritual invoca sentimentos que demonstram a existência do amor, da fé, da esperança, da confiança, do deslumbramento e das inspirações; e daí provém o significado e a razão para a existência. “ (tradução de Ana Caramelo) ]

segunda-feira, julho 17, 2006

Conceitos (1)

Espiritualidade é...

"...a unifying force of a person; the essence of being that permeates all of life and is manifested in one's being, knowing, and doing; the interconnectedness with self, others, nature, and God/Life Force/Absolute/Transcendent"

Dossey, B. M.; Guzzetta, C.E. (2000). Holistic nursing practice (cap 1). in: Dossey, B.M., Keegan, L., Guzzeta, C.E. (eds), Holistic nursing: A handbook for practice. 3rd ed., Rockville, MD: Aspen, p.7

[...uma força unificadora da pessoa, a essência de ser que permeia toda a vida e se manifesta no próprio ser, saber e fazer: a conexão com o eu, os outros, a natureza, e Deus/Vida/ Força/Absoluto/Transcendente " (tradução de Ana Caramelo)]

domingo, julho 09, 2006

Notícias (1)

Lori Knutson, directora do Institute for Health and Healing do Abbott Northwestern Hospital, nomeada American Holistic Nurse of the Year 2006 pela American Holistic Nursing Association (AHNA). Mais informação...

sábado, julho 08, 2006

Sugestões (4)

"Trata-se, afinal, de entre outros objectivos, o de renovar a esperança!"


Uma frase que poderia pertencer a um post deste blog. Mas está aqui. Num blog que já nos linkou...

Vamos lá comentar?

quarta-feira, julho 05, 2006

Escutar os outros (2)

Caminante No Hay Camino

Todo pasa y todo queda,
pero lo nuestro es pasar,
pasar haciendo caminos,
caminos sobre el mar.

Nunca persequí la gloria,
ni dejar en la memoria
de los hombres mi canción;
yo amo los mundos sutiles,
ingrávidos y gentiles,
como pompas de jabón.

Me gusta verlos pintarse
de sol y grana, volar
bajo el cielo azul, temblar
súbitamente y quebrarse...

Nunca perseguí la gloria.

Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.

Al andar se hace camino
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.

Caminante no hay camino
sino estelas en la mar...

Hace algún tiempo en ese lugar
donde hoy los bosques se visten de espinos
se oyó la voz de un poeta gritar
"Caminante no hay camino,
se hace camino al andar..."

Golpe a golpe, verso a verso...

Murió el poeta lejos del hogar.
Le cubre el polvo de un país vecino.
Al alejarse le vieron llorar.
"Caminante no hay camino,
se hace camino al andar..."

Golpe a golpe, verso a verso...

Cuando el jilguero no puede cantar.
Cuando el poeta es un peregrino,
cuando de nada nos sirve rezar.
"Caminante no hay camino,
se hace camino al andar..."

Golpe a golpe, verso a verso.

Antonio Machado (1875-1939)

segunda-feira, julho 03, 2006

Sugestões (3)

Num comentário anterior foi deixada a sugestão para visitarmos o The Chalice of Repose Project ®, Inc , onde se combina o rigor intelectual com princípios espirituais.

É feita ali também uma referência a "The 4th Annual Integrating Spirit & Caregiving Conference:Contemplative Approaches to End of Life and Elder Care", promovido pelo Naropa Institute...

Obrigada Nela, volta sempre!

Sugestões (2)

Vale a pena ler:

Spiritual nursing care: state of the art
por Melanie McEWEN

ABSTRACT: Until recently, little attention has been given to spiritual dimensions in the nursing literature. This article reviews spiritual nursing care in the nursing literature, including basic concepts and current thoughts on spirituality-related research. In addition, it describes mechanisms that may be used to promote spiritual care and outlines the need to enhance research efforts in this vital area.

( Holist Nurs Pract. 2005 Jul-Aug;19(4):161-8 )

domingo, julho 02, 2006

Escutar os outros (1)

ESPERANÇA

Canto.
mas o meu canto é triste.
Não sou capaz de nenhum outro, agora.
Em cada verso chora
Uma ilusão,
Tolhida na amplidão
Que lhe sonhei...
Felizmente que sei
Cantar sem pressa.
Que sei recomeçar...
Que sei que há uma promessa no acto de cantar...

Miguel Torga, Diário, 22.06.1977

quarta-feira, junho 28, 2006

Sugestões (1)

Vale a pena ler:

A kaleidoscope of understandings: Spiritual nursing in a multi-faith society

por J. MacLaren

BACKGROUND: Spirituality is an increasingly discussed topic in nursing. In some parts of the UK there is a policy requirement to establish policies of spiritual health care which are appropriate to a multi-cultural society. In the nursing literature, spirituality is discussed from religious and secular perspectives which seem impossible to reconcile into a coherent philosophy.
AIMS: To discuss the relationship of spirituality to nursing and to suggest how we can think about spirituality as nurses working in a society of many faiths and cultures.
DISCUSSION: Spirituality can be thought of in relation to individual patients and nurses. It also has significance for the profession of nursing and for health care as a whole. The difficulty of defining spirituality is discussed, and it is suggested that a definition of 'spiritual nursing' may be more achievable. Different concepts of spirituality are compared, including religious and secular spirituality. The relationship between religion and spirituality is seen as potentially problematic, with some religions denying the existence of secular spirituality. Secular spirituality and New Age movements are non-religious but spiritually influential phenomena. The problem for nursing is how to reconcile the immense variety of approaches to spirituality.
CONCLUSIONS: The concept of spirituality as a meta-narrative is considered, and a postmodern appreciation of pluralism is employed as a way of embracing different spiritual realities. Spiritual nursing can be an opportunity for nurses to enlarge their understanding of the human condition rather than a narrowly defined concept to be applied within a model of practice.

(J Adv Nurs. 2004; 45(5):457-64)

Razões de ser

Perante a evidência da relação entre espiritualidade e saúde, temos consciência da importância da dimensão espiritual, tanto quanto a física, psicológica, social e cultural, nos cuidados de enfermagem.

A espiritualidade atravessa as fronteiras culturais e religiosas e caracteriza-se pela fé, procura de significado e sentido da vida, relação com os outros, com o mundo e com a transcendência, originando paz interior e bem-estar integral...